É preciso mais do que um gesso e um pouco de tempo para curar ossos quebrados. Quer se trate de um soldado ferido na batalha, uma vítima de acidente de carro, ou uma pessoa idosa que tenha caído, o dano pode ser tão extenso que os ossos podem nunca curar corretamente, deixando as pessoas aleijadas ou com outros problemas graves. Agora, os pesquisadores combinaram ultra-som, células-tronco e terapia genética para estimular o reparo ósseo robusto. Até agora, o trabalho só foi realizado em animais. Mas já foi tão bem sucedido que rapidamente será direcionado a ensaios clínicos humanos.
Esta nova pesquisa “tem uma enorme significância clínica”, diz David Kulber, que dirige o ‘Center for Plastic and Reconstructive Surgery at Cedars-Sinai Medical Center’ em Los Angeles, California. “A tecnologia de sermos capazes de estimular o crescimento ósseo é realmente admirável”.
É também uma tecnologia para a qual há uma necessidade flagrante. Só nos Estados Unidos, cerca de 100.000 pessoas por ano sofrem com o que é conhecido como ‘fratura não-unida’. Nesses casos, partes de um osso podem estar completamente ausentes, ou tão estilhaçadas, que o osso não pode ser remontado. Nesses casos, os médicos tipicamente enxertam outros ossos no local. Idealmente, esse osso vem da mesma pessoa – muitas vezes retirada da pelve, um procedimento doloroso que agrava os ferimentos de uma pessoa e o tempo de recuperação.
Quando este enxerto não for possível, os médicos recorrem a cadáveres para obter o osso extra. Mas esse osso deve ser esterilizado antes de ser implantado, o que lhe rouba proteínas e outras moléculas de sinalização que encorajam a sua regeneração uma vez transplantado, diminuindo assim as chances de uma recuperação completa.
Pesquisadores há muito tempo tentam melhorar as coisas nessa área por meio do crescimento de ossos novos sem o uso de um enxerto. Para tanto, eles normalmente primeiro preenchem as lacunas no osso com um material estrutural natural chamado colágeno. O colágeno encoraja as próprias células-tronco formadoras de ossos de uma pessoa, chamadas ‘células-tronco mesenquimais (MSCs)’, a migrar para a área afetada. O problema é que as MSCs não apenas diferenciams-e em osteócitos, as células produtoras de osso. Elas também podem se transformar em células de tecido adiposo ou tecido cicatricial.
Os pesquisadores tentaram durante anos dirigir as MSCs para se tornarem osteócitos, expondo-as a uma ou mais proteínas morfogenéticas ósseas (BMPs), sinalizando moléculas que acionam as células para se transformarem em células formadoras de osso. Mas para que essa diferenciação ocorra, as MSCs devem estar expostas a BMPs por até uma semana. No entanto, se as BMPs são simplesmente injetadas no local de uma fratura, elas se dissipam em apenas algumas horas.
Em um esforço para produzir um sinal de BMPs durável, os pesquisadores, liderados por Dan Gazit, especialista em medicina regenerativa no Cedars-Sinai, voltaram-se para o uso de vírus para introduzir cópias extras de genes BMP em MSCs para que as células produzam proteínas o suficiente para desencadear sua própria diferenciação. Mas o sucesso também tem sido limitado.
Nos últimos anos, a equipe de Gazit desenvolveu uma estratégia alternativa para a obtenção eficiente de genes em MSCs sem o uso de vírus. Os pesquisadores começam por preencher a ferida com a matriz de colágeno usual e esperam um par de semanas para que as células-tronco infiltrem-se na estrutura óssea.
Eles então criam uma solução contendo inúmeras cópias do gene de interesse juntamente com um gás cheio de micron bolhas encapsulado por uma fina casca de moléculas de gordura. Depois de injetar esta solução no local da fratura, eles passam sobre a área uma varinha de ultra-som, assim como é feito pelos obstetras para verificar a saúde de um feto. Os pulsos ultra-sônicos da varinha explodem as microbolhas, promovendo rapidamente nano-furos feitos sob medida em todas as células tronco adjacentes, o que permite que os genes na solução entrem.
Em 2014, Gazit e colegas reportaram o uso deste procedimento para introduzir genes repórter em grandes fraturas em modelos animais. Mas quando eles usaram o procedimento para introduzir genes para duas diferentes BMPs – BMP-2 e BMP-7 – eles detectaram que alguns ossos tiveram algum crescimento, mas não o suficiente para curar as fraturas.
O grupo de Gazit obteve melhores resultados usando a mesma abordagem para inserir cópias do gene para BMP-6 em suínos que sofreram fraturas cirúrgicas com espaços de um centímetro em um osso da perna.
Depois de oito semanas, eles descobriram que a fratura foi fechada e a perna estava curada – em todos os animais tratados. De fato, o procedimento foi tão eficaz que as fraturas cicatrizaram tão bem quanto os enxertos ósseos que foram realizados usando osso do mesmo animal, que é, atualmente, o tratamento preferido. O estudo foi publicado no dia 17 de Maio de 2017 na revista Science Translational Medicine.
Os resultados são “apenas o tipo de coisa que precisamos para avançarmos com este tipo de estudo”, diz Johnny Huard, um pesquisador de ortopedia da Universidade de Texas Health Science Center, em Houston. No entanto, ele observa, os suínos utilizados neste estudo eram todos de menos de um ano de idade.
Os animais mais jovens, e também as pessoas, tendem a ter muito mais MSC do que os mais velhos, diz ele. E grandes fraturas são muito mais comuns nos idosos do que os jovens. Então, Huard sugere que antes que a abordagem esteja pronta para testes em pessoas com fraturas ósseas, seria bom primeiro ver se o procedimento é igualmente bem sucedido em animais mais velhos.
Fonte: Science Magazine
Leia o artigo: Science Translational Medicine